Ninguém Viu, um conto de Márcio Oliveira com mistérios, ciúmes e um fim de semana fatal. Qual o segredo oculto por trás desse terror queer?

Ninguém Viu de Márcio Oliveira é aquele conto de terror queer que bebe da fonte dos ícones da cultura pop. Uma viagem de fim de semana entre amigos que deveria ser divertida e inesquecível, acaba se tornando um pesadelo terrível, com um crime que ninguém consegue explicar.

E quando a história mistura saúde mental com sobrenatural? Será que essa fórmula ainda funciona? Se você assistiu Na Companhia do Medo (2003) e A Morte do Demônio (2013), sabe bem do que estou falando. Apesar das narrativas serem diferentes, ambos os filmes levantam dúvidas sobre a saúde mental de seus protagonistas, invalidando seu discurso sobre forças sobrenaturais.

Mas o que dizer quando ciúmes e relacionamentos mal resolvidos estão envolvidos? Será que fica difícil acreditar que um crime brutal foi obra do desconhecido?

Você vai descobrir agora por que “Ninguém Viu” de Márcio Oliveira precisa entrar na sua lista de contos de terror queer…

Vem comigo, porque o Questão D tá on!

Ninguém Viu: Mistérios, Ciúmes e um Crime Sem Testemunhas

Eles só tinham uma viagem e um sonho, ter o melhor fim de semana que nunca tiveram. Isso porque Dener vivia um relacionamento tóxico com seus pais. Como eles sempre foram extremamente religiosos, proibiam o filho de participar de qualquer diversão que um adolescente comum deveria viver ao lado dos amigos. Além disso, não aceitavam sua sexualidade.

Inclusive, quando Dener se assumiu gay, seus pais o expulsaram de casa. Embora isso o tenha abalado emocionalmente, ele se sentiu aliviado. Isso porque, finalmente ele poderia viver sua vida, sem negar sua essência. E essa viagem com Gustavo e Mari marcava o início dessa nova fase de sua vida.

Mas nem tudo era tão perfeito, pois Dener e Gustavo tinham um passado mal resolvido. Os dois ficaram juntos por um tempo, mas Dener, com medo que seus pais fizessem algo de ruim com Gustavo, decidiu terminar para protegê-lo. Diante disso, Gustavo seguiu em frente e começou a se relacionar com Luís, provocando um certo ciúme em Dener, mesmo que ele tentasse não admitir.

E claro que não poderia faltar a melhor amiga dos ex’s, Mari a alma do grupo. Inclusive, foi ela quem escolheu o local da viagem: uma casa isolada, longe de qualquer sinal de celular. Um destino que, sinceramente, eu não encararia, e você?

E assim como Gustavo, Mari convidou sua ficante para ir com eles, Bárbara. Nem preciso dizer o quanto isso mexeu com Dener. Afinal, ele era o único que estava desacompanhado e iria segurar vela em uma viagem que ele tanto esperava? Ou seja, ao invés dele ir para se divertir, foi para passar raiva.

Mas tem como piorar? Você já viu viagem com ex que não terminou bem, ter paz em alguma momento?

E foi exatamente isso que aconteceu, Dener, em um impulso, beija Gustavo, provocando a fúria de Luís e de todos. Envergonhando pela torta de climão que ele causou, ele foge para a floresta, e como ele estava com muita raiva, acabou se perdendo… Mas o que ele não esperava era que essa noite mudaria sua vida para sempre…

Eu fui acusado de assassinato!

O que Acontece Quando Ninguém Vê?

Se você é fã de terror, já sabe que viagem com amigos para lugares isolados não é um bom sinal… Principalmente quando há sentimentos mal resolvidos no ar. Ou seja, o clima já estava pesado desde o início. Então não tinha como sair coisa boa dali.

Quem já assistiu A Bruxa de Blair (1999) sabe que florestas distantes da civilização não são amigas de ninguém, principalmente quando você está perdido. Inclusive, você já se perdeu em uma reserva florestal? Eu já, e é apavorante. Aquela sensação de estar andando em círculos é aterrorizante. Então o filme foi um gatilho para mim.

E como moro aqui em Belém do Pará, existem várias histórias sobre os Encantados da Amazônia – seres míticos e espirituais que são guardiãos da floresta e de seus habitantes – mas alguns leigos os chamam de “visagem”. Inclusive, em dezembro de 2020, tivemos um caso de um estudante que compartilhou sua experiência sobrenatural no Parque do Utinga, no X (antigo twitter).

O post viralizou e chamou a atenção de outras pessoas, que muitos compartilharam experiências semelhantes no local. O caso ganhou grandes proporções que até virou artigo do jornal local. Clique Aqui e Saiba Mais.

E ao ler Ninguém Viu de Márcio Oliveira, eu senti esse mesmo desespero. Quando Dener percebe uma presença se aproximando no meio da floresta, com uma energia pesada e arrepiante, que você sente um medo crescente – uma sensação muito diferente de um Encantado da Amazônia.

“A gente ficou horas tentando te achar na mata e não encontrávamos de jeito nenhum, até que ouvimos você gritar e te achamos jogado no chão no meio do nada.”

Inspirações da Cultura Pop em Ninguém Viu de Márcio Oliveira

O fato do conto já começar com Dener contanto que foi preso por assassinato e que não foi ele, mostra o quanto o autor se inspirou em referências da cultura pop como:

  • Ronald DeFeo, Amytiville em 1974: um jovem de 23 anos que assassinou brutalmente seus pais e quatro irmãos enquanto dormiam. No início ele alegava envolvimento da máfia, mas depois confessou os crimes, alegando que escutava vozes que o mandaram cometer os crimes. A defesa tentou usar esta informação, alegando insanidade mental. Mas Ronald foi condenado a prisão perpétua – falecendo em 2021.
  • Arne Cheyne Johnson, Caso do Demônio de Connectcut em 1981: um jovem tinha 19 anos, foi acusado de assassinar Alan Bono, o dono de um canil em que trabalhava. Esse caso ganhou uma grande repercusão, porque foi a primeia vez que a desfesa dos EUA, usou o termo “possessão demoníaca”, em um tribunal de assassinato. Claro que o juri não considerou, e ele foi condenado a 20 anos de prisão. Esse caso inclusive foi retratado em Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônio (2021) e no documentário O Diabo no Tribunal (2023), original Netflix.

Vale lembrar que ambos os casos foram investigados por Ed e Lorraine Warren. Inclusive se você der um google, vai encontrar mais detalhes e curiosidades sobre estes dois casos. Vale à pena conferir se você não for sensível com o tema posssessão.

E assim como nos casos acima mencionados, a história se repete aqui em Ninguém Viu, que aborda sanidade mental e o sobrenatural. Afinal, além de conflitos pessoias entre o “assassino” e as vítimas, não há testemunhas que confirmem sua versão. E cá entre nós… em tempos de debates sobre saúde mental, fica difícil de acreditar. Né verdade?

Até porque caso sobrenatural não é bagunça. Assim como qualquer caso normal, ele passa por uma investigação e, mesmo assim, nem vai inocentar alguém de um crime.

“Mas eu sentia que era outra pessoa me observando. Olho para a janela e vejo um vulto passando e com isso me assusto, quase caindo.”

Ninguém Viu: Um Terror Queer que Você Precisa Ler

Não é de hoje que o terror queer está presente na literatura. Historicamente temos clássicos como Carmilla (1872) do escritor irlândes Sheridan Le Fanu. Além de ser uma obra que precedeu a publicação de Drácula de Bram Stoker, ela traz a primeira história de uma vampira lésbica, que foi popularizada no século seguinte.

Vale lembrar que existem outras obras literárias e audivisuais que abordam temas da comunidade LGBTQIAPN+ tanto abertamente, quanto de forma codificada. Inclusive, algumas delas são adotadas e ressignificadas e tranformam-se em metáforas e analogias de dentro da comunidade. Como esse é um assunto longo e que merece uma atenção especial, vou deixar para um próximo post. Por isso aguarde.

Mas voltando para nossa análise…

O conto Ninguém Viu de Marcio Oliveira segue a narrativa de um terror queer, com uma forte crítica social. Afinal, a história começa com Dener contando que foi preso e acusado por um crime que não cometeu. Apesar dele negar as acusações, todas as evidências apontam ele como culpado, principalmente por sua relação próxima com as vítimas e por terem conflitos envolvendo ciúmes, o que muitos acreditam ter levado o jovem a cometer um crime passional.

Vale lembrar que Dener como um jovem LGBTQIAPN+, já carrega consigo o peso de viver em uma sociedade conservadora e hostil. A força sobrenatural no conto acaba se tornando uma metáfora para as opressões que a comunidade LGBTQIAPN+ enfrenta diariamente. Ou seja, não importa qual seja a verdade, mas a sociedade conservadora vai alimentar que a narrativa de que o culpado é sempre aquele que não segue suas normas, problemáticas e hostis.

“Muitas pessoas acham que eu sou esquizofrênico, que devo passar por avaliação psicológica e também por um clínica de reabilitação…”

Inclusive quando li a primeira vez, eu tive a impressão que o conto reforçava esse estereótipo hostilizado, mas ao ler novamente e analisar as características da força sobrenatural, minha ficha caiu. Não era sobre “mais um” personagem LGBTQIAPN+ perpetuando um esterótipo conservador, e sim uma crítica ao sistema que tenta excluir de todas as maneiras, quem apenas quer viver a vida sem ter que esconder sua essência.

Por isso, O conto Ninguém Viu de Márcio Oliveira não é apenas mais uma história de medo, e sim uma reflexão sobre identidade e representatividade queer, que comprova o quanto a cultura pop é uma extensão de nosso dia a dia.

Você já leu Ninguém Viu de Márcio Oliveira? O que você achou? Você encontrou outras referências na literaruta e no audiovisual? Deixa seu comentário no instagram.

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Até o próximo post 😉

Capa do livro Ninguém Viu de Marcio Oliveira em uma formato de livro físico | Questão D

Ficha Técnica

Título: Ninguém Viu
Gênero: Terror
Autor: Márcio Oliveira
N° de Páginas: 46
Idioma: Português
Formato: Epub (Kindle)
Classificação Indicativa: A15
Data de Publicação: 31 de outubro de 2023
Onde Comprar: Amazon

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Dandy Souza

Web Designer e Videomaker. Sou um caçador de "easter eggs"e ativista da cultura pop. Criei o "Questão D" para mostrar que sci-fi, terror e o suspense são gêneros que além de entreter, têm um papel social interessante e fora da curva.Seja bem-vindes, porque o Questão D tá On!
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