Será que a vida realmente imita a arte, ou arte imita a vida? Bem se tratando de O Homem Invisível (2020), a segunda opção caiu como uma luva. Até porque trouxe à tona, o debate sobre relacionamento abusivo.
E posso ser ousado em dizer que ele abordou o assunto com maestria, pois você entra na atmosfera de medo e tensão da vítima, e tem as mesmas sensações. Vale lembrar que o filme é carregado de metáforas, o que enriqueceu seu enredo.
Sim, devo dizer que essa versão de Leigh Whannell é uma obra consagrada, ao trazer uma adaptação de 1897, para uma linguagem atualizada. Só temos a agradecer, pois esse é aquele filme que vira pauta em grupo de amigos e cinéfilos que gostam de analisar e debater, as mensagens do filme.
Então, vem comigo! Porque precisamos falar sobre O Homem Invisível e por que ele é um alerta tanto para quem está vivendo um relacionamento abusivo, para quem conhece algum parente ou amigo que esteja vivendo. Acredite, o filme dá muitas formas de interpretar os sinais de pedido de socorro.
Atenção!!! O Post a seguir contém spoilers. Por isso, não é recomendável para quem ainda não assistiu o filme. Caso deseje continuar, é por sua conta e risco. Okay? #PartiuReview
O Homem Invísível | O Fim ou o Começo de Um Pesadelo?
O filme inicia com a Cecilia Kass (Elisabeth Moss) acordando no meio da madrugada e dando início à sua fuga de liberdade. O ambiente escuro, as viradas de câmeras e apenas os barulhos do ambiente, ajudam a compor a tensão e o medo de que Adrian Griffin (Oliver Jackson-Cohen) irá acordar a qualquer momento…
E apesar de Adrian está sob efeito de Diazepan, a cada etapa que vai dando certo, é um respiro de alívio que você dar. Até porque, você consegue se conectar de imediato com Cece. Mas como nenhum plano é perfeito, por um descuido, nossa protagonista acaba ativando o alarme do carro, quando tentou soltar seu cachorro para a liberdade… É nessa hora que o jogo de gato e rato começa.
E já não bastava conseguir sair daquela casa sinistra, ainda tinha que passar por uma floresta escura, até chegar na estrada. Mas como dizem, com medo e objetivo, nós adquirimos forças inexplicáveis. Até que Cece consegue chegar na estrada e entrar no carro da irmã Emily Kass (Harriet Dyer), que não entede nada do que está acontecendo. Até que Adrian aparece e quebra o vidro do carro, mas elas conseguem fugir – Ufa!!!
É nesse momento que você entende que Cece nunca comentou sobre o terror que estava vivendo. Inclusive, é um comportamento muito comum de quem é vítima de algum tipo de abuso (psicológico, físico, entre outros). Pois um certo sentimento de vergonha e de culpa, domina o subconsciente da vítima. Por isso, é importante observar o comportamento da pessoa, pois esse processo de confiança é algo acontece devagar, e é precisamos mostrar que ela não está sozinha.
Até porque crescemos dentro de uma estrutura com frases feitas como “Ela passa por isso porque quer”, “Ela sabia onde estava se metendo”, “Por que demorou tanto para falar?”, entre outros. Ou seja, ao invés de focar no abusador, foca-se na mulher que depois de viver um inferno e ter seu psicológico todo ferrado, ainda é culpada por dar seu grito de liberdade?
Perceba como o processo de desconstrução é importante para enxergamos esses problemas, para combatê-los e proteger quem realmente é a vítima.
O Homem Invisível | Efeito Colateral de um Relacionamento Abusivo
Duas semanas se passaram, e descobrimos que Cece está na casa de uma amigo de sua irmã, James Lanier (Aldis Hodge). Um policial que mora junto com sua filha Sydney Lanier (Storm Reid). Apesar de ninguém saber onde ela está, Cecília não consegue sair de casa, nem para tomar um ar puro. Afinal, só quem viveu sabe, o que é sair de um pesadelo e ter medo de viver tudo de novo.
Mas os primeiros passos da mudança começam a chegar, quando ela recebe a notícia que Adrian morreu, após um possível suicídio. E é nesse momento que Cece sente um certo alívio e disposta a soltar tudo aquilo que estava preso em sua garganta.
E aí que todos descobrem o terror que Adrian fazia na vida de Cecília: controlando suas ligações, suas roupas, sua comida, seus pensamentos, agredindo fisicamente e querendo forçá-la a ter um bebê… Ou seja, isso foi uma espécie de exorcismo, e que só após colocar tudo para fora, ela finalmente consegue ir para frente da casa, e sentir o gostinho da tão sonhada liberdade.
É importante mencionar, que antes de saber que Adrian morreu, Cece não conseguia dormir e tinha alguns cuidados, que eram considerados paranoias como cobrir a webcam do notebook e ficar na janela observando por horas, tudo por medo de que Adrian aparecesse a qualquer momento. Ou seja, certas práticas que para muitos são consideradas úteis e essenciais no cotidiano, são um fardo para quem possui traumas.
Logo, o filme deixa aqui o alerta: Observe o comportamento de seus parentes e amigos, pois muitos sinais são deixados, e não são percebidos. Bloqueando nossa visão, deixando assim de ajudar do jeito certo. Por isso, fique atento, pois você pode estar salvando uma vida.
O Homem Invísivel | Como a Vítima de um Relacionamento Abusivo é Vista?
Aqui é a fase do filme que percebemos como a vítima possui estigmas, principalmente vindos da sociedade. Um exemplo disso é quando Cecília recebe uma notificação de testamento para heredeiros, mas não deram muita importânica em investigar como descobriram o endereço que ela estava… o que reforça, o quanto uma vítima não estará segura 100%. Pegou a visão?
E o que dizer da reunião com Tom Griffin (Michael Dorman), irmão de Adrian, que lê o testamento e insinua que a vítima é interesseira. Ai, ai, ai… é de tirar qualquer um do sério.
E a condição absurda de que Cecilia perderia a herança se cometesse algum crime? Não sei você, mas é preciso estar com o emocional controlado para identificar que algo de errado não está certo aí – e que tudo não passava de uma cilada.
E se for observar, nem a Cecilia e sua irmã, estavam em condições de analisar o terreno perigoso que estavam se metendo. Até porque, Tom estava provocando ao tentar desacreditar a vítima de todo o terror que ela viveu. E Emily acabou caindo, pois se envolveu emocionalmente, fazendo perdendo alguns detalhes da manipulação em todo processo. Ou seja…. mais um alerta!
Inclusive. tenha cuidado na hora de escolher seu representante ou advogado. Dê preferencia a alguém que não tenha vínculo familiar algum, pois o emocional sempre vai falar mais alto. E conforme o filme avança, comprovamos o quanto isso foi afetado, pois misturou-se o profissional com o pessoal. Você conseguiu perceber isso?
O Homem Invísivel | Quando Você Pensa que Vai Recomeçar…
É neste momento que a metáfora “o tormento continua” é trabalhada no filme. Afinal, Cecília está tentando recomeçar sua vida pessoal e profissional, mas começa a ser impedida de ir atrás de seus sonhos.
Então temos uma sequência de perdas no meio do seu caminho como:
- Uma entrevista de emprego fracassada
- A relação com sua irmã prejudicada, após o envio de um e-mail com seu endereço
- A confiança de seus amigos abaladas
Inclusive o momento que Cece vai até o sótão podemos intepretar como um encontro com seu subconsciente, para lidar com aquilo que ela estava tentando bloquear em sua mente. Logo, o seu portifólio e o celular de Adrian, que encontra no compartimento, representam que ninguém poderá ajudá-la em sua recuperação mental (infelizmente).
Até porque, repito, vivemos em uma estrutura de sociedade, em que a palavra da vítima de abuso sempre é colocada em dúvida – e muitas das vezes quando a verdade vem à tona, já é tarde demais.
Um outro ponto importante é a metáfora do homem invisível nesses momentos de perseguição de Cecilia, o quanto o agressor manipula toda a situação, para abafar o pedido de socorro – fazendo a vítima passar como louca. E você vê isso muito bem representando na sequência em que a protagonista joga o balde de tinta, é agredida pelo homem invisível e ao fugir, as câmeras de segurança apenas captam sua imagem.
Será que isso na vida real não acontece do mesmo jeito? Você já reparou como os culpados sempre atacam a sanidade mental das vítimas, principalmente mulheres, para serem superiores? Então fique atento.
O Homem Invisível | A Vida É Feita de Escolhas? Então Eu já Fiz a Minha…
O momento em que Cecilia vai até a casa de Adrian, representam dois pontos: a tentativa de proteger pessoas queridas e colocar um ponto final, de uma vez por todas – nem que isso gere consequências irreversíveis…
E o momento em que ela descobre a verdade sobre a falsa morte de Adrian, e de sua invenção insana, representa aquele choque em que a vítima se depara com a verdade que nunca enxergava sobre seu abusador. Então ela percebe que precisa agir com sabedora, para virar o jogo…
Agora me diz… como alguém com o emocional e psicológico abalado, sem apoio de ninguém, vai conseguir agir de forma estratégica? Imagina sensação de impotência ao tentar pedir socorro e ninguém escutar você?
E isso acontece quando Cece tenta contar tudo a sua irmã Emily, mas infelizmente é morta – e ainda por cima vira a principal suspeita. Resultado? Foi internada e considera louca.. Além de ter sua herança cancelada. Lembra que falei no começo do post que a exigência na herança cheirava a cilada? Pois é… tudo é confirmado aqui.
Percebeu como Adrian é uma representação clara da realidade do que um abusador é capaz?
O Homem Invisível | E a Simbologia do Corredor e da Chuva
A partir da prisão de Cece, temos uma sequência tensa e angustiante. Afinal, já não basta perder o herança e ser acusada de um crime que não cometeu, ainda descobrir que está grávida de seu pior pesadelo… ou seja, ela não tem poder de decisão em seu próprio corpo? Então ela não tem mais nada a perder, e o jeito é entrar na guerra usando a fraqueza do inimigo – que aqui no caso seria o bebê, afinal essa era a obsessão de Adrian.
Assim, a única solução foi fingir um suicido, para provar toda a verdade. Como dizem, quando se tem um objetivo, tudo acontece. O plano não apenas deu certo, como todos comprovaram que Cece estava falando a verdade.
Logo, nos deparamos com um massacre no sanatório, onde ninguém é poupado. Inclusive tudo acontece em um corredor, aos olhos dos seguranças e das câmeras. E isso acontece, porque a simbologia do corredor de um hospital significa os obstáculos enfrentados para alcançar seu objetivo – aqui no caso é a liberdade e a verdade.
E ao sair do sanatório, percebemos que está chovendo. E esse momento representa que a verdade vem à tona. Repare que a roupa do Homem Invisível começa a apresentar defeitos durante a chuva. Logo, esse momento representa a saída de Cece de alma lavada, pois agora todos que duvidaram, estão vendo que ela sempre falou a verdade.
Será que na vida real acontece diferente? Me responde nos comentários.
E não pense que as metáforas sobre acabam por aqui. Existem mais detalhes que refletem o comportamento da sociedade sobre o tema relacionamento abusivo. Mas como não quero estragar a sua experiência sobre as descobertas do filme. Eu finalizo por aqui.
Vale lembrar que O Homem Invisível foi lançado logo início da pandemia. Quando os cuidados com a higiene e o distanciamento social, passaram a fazer partes das normas de segurança sanitária. E com isso os cinemas tiveram suas atividades suspensas.
E apesar de muitos não terem assistido, ele está disponível nos On-Demand da vida. O que reforça mais ainda o título de filme do ano, com toda razão. Além da experiência do usuário, o debate social é necessário, causando reflexões, desconstrução e mudança de posturas. Não é verdade?
Inclusive, existe um canal de streaming gratuito que trás cenas de filmes, séries e novelas que ilustram os tipos de agressões : física, psicológica, moral, patrimonial e sexual. Ele foi criado pela Fbiz para o Instituto Maria da Penha, e se chama 180Play – um novo jeito de ver séries, filmes e novelas. Seu objetivo é estimular vítimas e testemunhas de violência contra mulher a denunciarem os agressores. Clique aqui e Saiba Mais.
E se você está passando por algo parecido, saiba que você não está sozinha. Disque 180 e Denuncie.
Como foi sua sua experiência com filme? Deixe seu comentário.
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Até o próximo post! 😉
Ficha Técnica:
Título Original: The Invesible Man
Gênero: Ficção Científica, Mistério, Terror
Direção: Leigh Whannell
Elenco: Elisabeth Moss, Aldis Hodge, Harriet Dyer, Maichel Dorman, Oliver Jackson-Cohen, Storm Reid, entre outros.
Classificação: 14 anos
Duração: 125 minutos
País: EUA
Ano: 2020
Trailer:
